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A responsabilidade solidária das agências de turismo

A responsabilidade solidária hoje se torna cada vez mais comum nas ações judiciais, mas você sabe o que é responsabilidade solidária? Já ouviu falar? Já se encontrou em alguma situação envolvido por ela?

Antes de adentrarmos neste assunto, é muito importante que definamos o que é turismo: A definição de Mathieson e Wall é vista hoje como a mais completa, pois consideram que “o turismo é o movimento temporário de pessoas para destinos fora dos seus locais habituais de trabalho e residência, as atividades desenvolvidas durante a permanência nesses destinos e as facilidades criadas para satisfazer as suas necessidades”. Evidenciando, assim, a complexidade da atividade turística e as relações que esta envolve.

Veremos também o que faz uma agência de turismo: Faz “reserva de passagens aéreas, aluguel de veículos, reservas de hotéis, seguros de viagens, serviço de receptivo, serviços relativos à documentação de viagens, solicitação de vistos, câmbio e ingressos para shows e eventos, vende pacotes nacionais e internacionais” e cruzeiros. É um elo entre o cliente e o fornecedor de serviços, disponibilizando, sem fronteiras os serviços turísticos.

Aqui fica, então, bem clara a função intermediária das agências de viagens, entre os produtos turísticos e os clientes. É relevante notar que, diferente do que acontece nas operadoras, as agências de viagens não agregam valor aos produtos, apenas os repassam aos consumidores. Por isso nós passamos a falar de solidariedade.

Que depende da lei ou da vontade das partes, ela não se presume, ela resulta, da lei ou da vontade das partes, artigo 265 do Código Civil. A solidariedade quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, mais de um devedor, cada um com direito ou obrigado a dívida toda, ou seja, uma obrigação onde tem vários sujeitos concorrendo para prestá-la ou recebê-la, artigo 264 do Código Civil.

A agência de viagem responde solidariamente porque vende os serviços a serem prestados por empresa aéreas, consolidadores, serviços de receptivo e os demais serviços citados acima, assumindo risco pela correta realização daqueles, constituindo-se, assim, parte legítima da demanda (Código de Defesa do Consumidor – Lei 8.078/90).

Com fundamento no artigo 275 do Código Civil, o credor tem direito a exigir e receber de um ou de alguns devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum. Na solidariedade passiva, a multiplicidade de devedores, sendo que cada um responde na totalidade pelo cumprimento da obrigação, como se fosse um único devedor, no caso da solidariedade, o credor pode escolher o devedor que mais lhe aprouver para pagar a dívida. Se este não pagá-la, poderá voltar-se contra os demais, conjunta ou isoladamente.

O turismo a muito tempo ocupa uma importante posição na economia mundial. Grandes eventos, férias, lazer, trabalho. São diversos os motivos que atraem milhões de pessoas para lugares diferentes em todo o mundo. Diante do grande fluxo de consumidores turistas e as ofertas de produtos e serviços a eles disponibilizadas, contratempos poderão acontecer, não obstante os imprevistos, o direito existe para garantir uma mínima proteção aos que viajam.
Usa-se como ferramenta o contrato para exigir o cumprimento do que foi pré-estabelecido com a agência, onde o contrato de turismo tem suas peculiaridades. Ele engloba diversos serviços que formam contratos próprios, como de transporte, hospedagem, receptivo etc, por isso alguns envolvidos tem dúvidas de até onde vai a responsabilidade de agências ao se vender um pacote com tantos serviços prestados por terceiros.

O Código de Defesa do Consumidor trás em seus artigos 12 e 14, as responsabilidades pelo fato do produto e do serviço, respectivamente. O artigo 12 o legislador listou todos aqueles envolvidos com o produto, já o 14 fala apenas em fornecedor, como sendo único responsável pelo fato do serviço. A explicação é que muitas vezes o fornecedor do serviço é o próprio prestador, que é a situação exata do turismo, que reúne diversos prestadores de serviço para formar o pacote turístico organizado pela agência de turismo e comercializado por uma agência de turismo.

A lei geral do turismo – LGT (lei 11.771/08), teve o veto do § 6° do artigo 27, quando ainda estava na fase de projeto (PL 3118/2008), que tentou afastar da atividade turística a aplicação do código de defesa do consumidor – CDC, dizia o texto do artigo 27 § 6° que: “A agência de turismo é responsável objetivamente pela intermediação ou execução direta dos serviços ofertados e solidariamente, de fornecedores que não puderem ser identificados, ou, ser estrangeiros, não possuírem representantes no país”. A estratégia no entanto não logrou êxito. Um dos argumentos dizia que o dispositivo poderia enfraquecer a posição do consumidor, ora, a equidade também é princípio expresso no CDC, tanto quanto a busca da harmonização de interesses, a boa fé e o equilíbrio, a educação e a informação sobre direitos e deveres entre fornecedores e consumidores.

Então a responsabilidade solidária aplica-se a todos os setores da economia desde que fique configurado que mais de um fornecedor causou ou contribuiu para causar o dano (CF, arts. 7º, § único e 25, § 2º CDC). O objetivo assim é demonstrar até onde a agência de turismo pode ser responsabilizada de maneira solidária ou diretamente; ou ainda, quando não cabe escolher a agência de viagem como responsável pelo vício.

Imagine a situação a qual, você se dirige a uma pequena agência de turismo para comprar uma passagem aérea. Ao chegar no aeroporto, tem a notícia desagradável que a companhia área vendeu mais passagens do que o número de assentos na aeronave disponibiliza, e que assim você só poderá viajar 6 horas após sua viajem marcada, implicando assim uma reviravolta em seus compromissos de trabalho no destino. Diante da situação hipotética, nossa legislação permite que você possa acionar qualquer das empresas, sendo tanto a agência de turismo, quanto a companhia aérea, ou até as duas simultaneamente, sendo assim a responsabilidade solidária sendo utilizada por você consumidor.

Entretanto, não podemos deixar de notar que o vício está no serviço prestado pela companhia aérea, a qual disponibilizou para a agência de turismo mais passagens do que eles disponibilizam de poltronas no avião, induzindo assim a agência em erro ao vender uma ou mais passagens, as quais não poderiam ter sido vendidas, já que se tinha alcançado já o número de poltronas vendidas. Esclarecendo que a agência de turismo ofereceu de boa fé a passagem aérea acreditando no que foi informado pela companhia área de que estava disponível. Neste caso , a agência de turismo foi mera intermediadora entre o consumidor e a empresa área, não tendo que se falar em responsabilidade solidária pelo bom senso, mesmo que, pela legislação, tenha o consumidor essa prerrogativa de escolher a quem ajuizar a ação. Além disso essa prática do “overbooking” é prática das companhias aéreas já considerada ilegal pelo Código de Defesa do Consumidor, artigos 20, 51, IV e XIII, pois descumpre o que é ofertado no contrato.

Outra situação hipotética a qual podemos citar é a contratação de um serviço de transporte terrestre, acreditando-se que seria prestado pela própria agência de turismo, sendo que este serviço é terceirizado sem que você saiba disso, sabendo somente no momento da prestação do serviço, sendo realizado o serviço com péssima qualidade. Neste caso em uma possível ação judicial cabe ao consumidor pela lógica mover ação contra a agência de turismo como responsável pelos danos causados e transtornos, pois para o consumidor o serviço foi prestado pela própria agência de turismo, enfatizando mais uma vez a prerrogativa do consumidor de escolher qual empresa processar ou até as duas simultaneamente, mas como dito, não podemos afastar a avaliação de cada situação pelo uso da lógica e bom senso.

Diante dos exemplos demonstrados, notamos que existem opiniões divergentes sobre a responsabilidades das agências de turismo, pois acreditamos que mesmo pela Responsabilidade Solidária, dando critério ao consumidor de escolher a quem ou quais processar, a questão não é pacífica ainda, pois apesar de ter como base o CDC, deve-se levar em consideração se toda situação deve ser levada a juízo.

Concluindo, o interessante é que as agências de viagens são na sua maioria empresas de pequeno porte e individuais e que o legislador ao fazer o CDC nivelou por cima o nível dessas empresas que estão no mercado carregando um grande fardo, das mazelas de prestadores de serviços como as companhias aéreas, hotéis, cia de navio e assim por diante. Como poderão sobreviver no mercado, se a ferramenta jurídica é totalmente contra o setor? Tal situação me faz lembrar a letra de uma canção que diz: “…maldita Geni…”, assim são as agências: “…malditas agências…” que ainda assim, na economia só ficam atrás da indústria automobilística e do petróleo. Agora para não acabarem de vez com as agências é importante que essas empresas não fiquem sem o Seguro de Responsabilidade Civil que hoje temos disponível no Brasil. Essa é a grande saída.

Autora: Rose Mary Faraco Larrat